Relato pessoal: sou aos 18 o que esperava ser aos 12?

Escrevi uma carta pro futuro para mim quando eu tinha 12 anos. Bom… este foi o ano de abri-la e depois de 6 anos e um pouquinho a surpresa: minha vida continua “maluca, corrida e estranha” como a eu de 12 anos descreveu. Nada mudou. Não em relação ao contexto geral. Claro, que hoje estou na faculdade e não no ensino fundamental, ainda tenho algumas amigas do passado, arranjei outr@s amig@s, uns abusivos outros não, assim como antigamente. O amor platônico que eu tinha saiu do armário. E eu achando que aquela primeira paixão avassaladora seria eterna! Ri da inocência das coisas que escrevi, depois as desejei de volta. Apesar da vida continuar na mesma, tenho a sensação que era mais feliz naquela época! Mas, será mesmo?

Eu tinha pouca idade, mas, já passava por tantos pormenores, e aquilo tudo era muito duro para mim. Hoje, com outra cabeça, não me abalaria tanto com os acontecimentos, contudo, sei que foi a adaptação causada pelas pisadas da vida. Aquela menina de 12 anos não fazia ideia do que ainda estava por vir de bom ou ruim.

Na carta há tantas esperanças! mesmo com tudo tão turvo e incompreensível, com tantos medos sobre o que me esperava no futuro. Penso: “Onde está essa esperança?”, “Onde foi parar a minha fé?”. Hoje em dia, eu só vou vivendo sem maiores expectativas. Cansei de me decepcionar. Hoje em dia, eu espero tudo de todo mundo. As pessoas provaram ser totalmente imprevisíveis. Ao longo desses 6 anos eu descobri, aprendi e resisti a tantas controversas humanas.

Ao olhar para trás, a maioria das minhas amigas eram abusivas, e eu as amava com meu coraçãozinho ingênuo e me sentia um lixo por nunca ser o suficiente para elas. Como é estranho olhar para trás e perceber que as relações fraternais, parentais, amorosas que tive e que ainda tenho, cada uma delas foi colocando um tijolinho a minha volta e eu fui me escondendo e me isolando da vida, das pessoas, do sentimentos, fui me protegendo, me distanciando e BANG!!!! Quando vi, 6 anos depois tenho tantos problemas de saúde mental que eu nem sei…

Antes de iniciar a terapia e até no inicio, eu vivia me perguntando como vim parar aqui. Agora, depois de tantos aprendizados, eu entendo, compreendo, consigo enxergar como cada situação contribuiu. Mas, sabe qual a parte mais chata? Ter consciência do problema não resolve o problema. E mesmo que eu possa reconhecer, eu não consigo sair!

Não tem noção de como é difícil desfazer crenças autodestrutivas que as pessoas a nossa volta regaram e nos ensinaram a regar e tudo passou a ser um processo automático. É como se fosse o certo a fazer, me menosprezar e diminuir, porque foi assim que eu aprendi a lidar comigo, a me enxergar. Ao longo dos anos, as relações abusivas me fizeram acreditar nisso, eu insegura e vulnerável (…), acreditei . Ainda consigo ouvir as palavras das pessoas, consigo ver os rostos delas, consigo ver o olhar de desprezo estampado na cara, consigo me ver implorando por atenção e pedindo desculpas por ser eu mesma, como se ser eu fosse a coisa mais errada do mundo, e assim eu cresci acreditando. Ser eu é ser a pior pessoa do mundo. E como eu não conseguia me desvencilhar de mim, me odiei, odiei tudo em mim e ainda odeio( não tanto quanto antes, a terapia tem me ajudado muito nisso), odeio tudo que diz respeito a mim e não reconheço nenhuma das minhas conquistas. Para mim, todas elas foram pura sorte. Se alguém gosta de mim e me diz isso, ou me presenteia, me sino muito mal, porque não mereço nada disso, não sou digna de afeto, eu não sou uma pessoa boa, eu não presto!!! E ainda sou uma ótima atriz, falsa, porque consigo fazer as pessoas acreditarem que existem coisas boas aqui, no entanto, eu sou um grande vaso de merda. Atriz. Atriz em meu próprio corpo, foi o que sempre achei de mim, tanto por fingir sentir, ser amável, educada e tanto por nunca fazer nada que eu realmente queria, que realmente gostaria, que realmente me fizesse bem, passei a vida me anulando, fazendo o que as pessoas queriam, sejam eles quem quer que sejam. Minhas vontades e desejos sempre foram indignos de serem realizados, eu alimentei isso, as pessoas a minha volta alimentaram isso. Aprendi a me renunciar. Aprendi a não criar gostos, a não alimentar desejos, expectativas, pensamentos , opiniões, porque normalmente eles não eram levados em conta, eram totalmente menosprezados, se diluíam em mais dor e decepção. Passei todos esses anos olhando pra baixo e odiando a imagem no espelho, me sentindo feia, incapaz, insuficiente, louca, louca, porque era assim que me diziam que eu era quando eu deixava escapar minha espontaneidade, minha vontade de sair da caixinha e viver, sentir o sol, só um pouquinho. Me tornei indiferente. Tanto faz se coisas boas ou ruins acontecem, na verdade elas não tem mais esse nome pra mim, “bom” ou “ruim”, é só mais um acontecimento. “LOUCA. IDIOTA. Volta pra caixinha! Quantas opiniões ridículas! Que forma de pensar mais sem noção! Será que de você não sai nada de bom?” Não, não sai… é melhor eu ficar quietinha no meu canto e passar despercebida. Ser vista dói. E por mais que ficasse na minha, vinham as calúnias, as mentiras espalhadas, as amigas falsas, e a cada descoberta delas, eu desacreditava na vida, cada vez que eu vivia e entendia a maldade das pessoas, seja a minha volta, seja nos jornais as minhas esperanças quanto a bondade a humana desciam todas pelos ralo. Meu mundinho encantado da menina de 12 anos sumiu. Me vi dentro daquele lixo, afinal, eu sou humana e odiava minha humanidade, ela era a causa deu não conseguir fazer nada correto, nada de bom, por mais que tentasse com todas as forças, meus esforços valiam nada. Ainda bem que eu tinha pessoas muito amorosas a minha volta para reforçar mais isso, você não pode, não consegue, olhe só pra você, é mesmo uma idiota, ridícula, como pensou que poderia ao menos tentar? Me poupe da sua existência. E assim venho tentando poupar as pessoas de mim, dos meus pensamentos, opiniões, da minha aparência e da minha presença. Cada dia mais o mundo é estranho e inóspito para mim. Cada dia mais tudo que se distancia do meu colchão e dos meus olhos fechados, me corroem; abrir os olhos dói, sentir que ainda estou viva quando acordo é quase insuportável. Me perdoe Machado de 12 anos, mas não sou o sexo forte e decidido que você esperava ser nessa idade.

-Machado

Ps: Escrevi este texto a um bom tempo atrás e percebo que certas percepções sobre mim estão mais positivas, digamos. Lidar com a Depressão é um processo, ainda estou aprendendo. Contudo, sigo com minha companheira, fiel, não sei se por hora ou para sempre. Num dia somos amigas, noutro inimigas, em um dia nos dispomos a nos conhecer um pouco, em um outro somos completas desconhecidas e a cada dia convivemos, melhor dizendo, EU sobrevivo a ela.

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